terça-feira, fevereiro 05, 2008

Ainda sobre "a Corrupção"

tirado daqui, que tinha tirado dali

«O advogado Marinho Pinto, bastonário da Ordem, denunciou estentoriamente a corrupção do Estado e o mau funcionamento da justiça. Como os tempos são o que são, ninguém ouviu ou se importou com o que ele disse sobre a justiça (de resto, muito interessante e oportuno) e toda a gente se agarrou com volúpia e gula ao velho e gasto assunto da corrupção. Pacheco Pereira, por exemplo, exigiu o regresso à "ética republicana", embora não se conheça qualquer república, nem a romana, com a mais vaga sombra dessa "ética". E o general Garcia Leandro, que dirige o Observatório de Segurança, ameaçou o país com "uma explosão social" contra o regime e, surpreendentemente, revelou que já o convidaram para "encabeçar um movimento de indignação". Pior ainda, o general confessa que a sua própria "capacidade de resistência" a "tanta desvergonha" começa a "enfraquecer" e fala ominosamente do "final" da monarquia.

Talvez convenha perceber duas coisas sobre a corrupção. Primeira, onde há poder, há corrupção. E onde há pobreza, há mais corrupção. Destes dois truísmos resulta necessariamente que quanto maior é o poder ou a pobreza, maior é a corrupção. Portugal junta a uma atávica miséria um Estado monstruoso e autoritário e, por consequência, tem as condições perfeitas para produzir uma enorme quantidade de corrupção. Em Portugal nada se salva da corrupção: nem a administração local, nem a administração central, nem os partidos, nem os "negócios", nem os governos, nem o futebol. A corrupção está íntima da cultura "nacional", no centro da ordem estabelecida, na maneira como os portugueses tratam de si e se tratam entre si.

Não vale a pena, por isso, declamar, perorar, rugir e chorar. O mal só tem dois remédios: o enriquecimento do país, por um lado, e, por outro, uma drástica redução do Estado e, principalmente, da autoridade do Estado. Quanto ao enriquecimento, não parece próximo. Quanto à redução de um Estado com 700.000 funcionários, ninguém até hoje o conseguiu reformar. Pelo contrário, aumentou sempre, intocável e triunfante. Quarta ou quinta-feira, o dr. Silva Lopes perguntava na televisão por que não se metiam, pelo menos, meia dúzia de corruptos na cadeia. Como em Espanha. Ou em França. Ou na América. Não se metem, porque, a meter meia dúzia, acabavam por se meter uns milhares, ou umas dezenas de milhares. E também, evidentemente, porque nenhuma sociedade se persegue a si mesma.»
Vasco Pulido Valente

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